sexta-feira, 13 de março de 2009

A política perfeita (o texto prometido para o Blog)

Um aspecto tem me chamado muito a atenção nas discussões sobre cotas, bônus em vestibular, bolsa família, bolsa escola: a incessante busca pela política pública/social perfeita.

Acho a idéia linda. Quem não quer a perfeição? Como não sou “político profissional” ou administrador público, faço o que está nas minhas mãos para encontrar essa tal política perfeita. Voto e bato prosa nuns botecos ou fóruns de discussão (na falta daqueles tais cafés onde a crescente burguesia discutia as questões do dia).

Ok, algum problema com a perfeição? A PRINCÍPIO, NÃO. Mas se pensarmos bem, friamente... Peço que alguém me dê um exemplo de algo perfeito no mundo em que vivemos (não valem respostas metafísicas). É aí que eu quero chegar. Se prestarem atenção, vocês vão perceber que a mais simples questão e o debate mais banal são na verdade muito complexos. São sempre muitos detalhes e perspectivas a se considerar. Contudo, “na prática”, muitas vezes somos aprisionados numa maldita e infeliz oposição binária: sim ou não, 0 ou 1, a favor ou contra. Às vezes é quase impossível se chegar àqueles tais consensos. Isso é triste.

Vou dar alguns exemplos dessas infelizes oposições. Desculpem minha aparente ignorância e superficialidade. Eu juro que sei que as coisas não são tão simples, mas infelizmente, elas acabam ficando “simples” em muitos casos. Não quero exatamente convencer que meu posicionamento é o melhor, apenas desejo estimular uma reflexão sobre o ato de “tomar uma posição” ou “escolher um lado”.

Exemplo 1: MST ou UDR

Condeno as ações mais violentas do MST. (E morro de dó dos ruralistas: quando tem lucros enormes contribuem para a nação (pelo menos dizem que sim); quando é época de crise o governo irresponsável tem que socorrer se não tem gente que simplesmente não planta (será que nunca ouviram falar em “pé-de-meia”?)

Voltando ao assunto, todos têm o direito a terra (todo mundo de acordo?). O fazendeiro e o sem terra têm direitos iguais (não é?). Tem fazendeiro gente boa e fazendeiro safado? (Deve ter, né?). Tem sem-terra legal e sem-terra sem vergonha? (Deve ter os dois, não é?).

Mas no fim das contas, quem condena o MST faz um favor a UDR (União Democrática Ruralista). QUERENDO OU NÃO, faz esse favor. Fala-se tão pouco da UDR e da bancada ruralista que as pessoas acabam esquecendo que elas existem. Mas existem e pressionam, existem e estão bem representadas. Minha escolha entre os dois? MST. Se eu fortalecer a UDR, vou negar a História, e isso eu não posso fazer.

MST X Ruralistas? Dos males fico com o menor, e, na medida em que o trem for avançando, a gente vai prendendo os bandidos (dos dois lados, não é?). Aí vão me dizer que executar essas prisões está difícil? Lógico que está difícil! Num estado tão alterado fica difícil! Mas garanto que, com o problema da terra resolvido, será bem mais fácil distinguir o bandido do homem desesperado e daquele que age em legítima defesa. Não acham?

Exemplo 2: Cota/bônus... ter ou não ter? Eis a questão

Temos que melhorar o ensino fundamental e médio. Temos de atuar na base, nos fundamentos. Temos que garantir a igualdade de oportunidades para todos os cidadãos desta linda nação. Ok, concordo, concordo, e DUVIDO QUE SE ALGUÉM PENSAR DIFERENTE VAI TER CORAGEM DE DIZER ISSO NESTE
ESPAÇO.

Uma pergunta: o que fazemos com a geração que já foi prejudicada pela escola de má qualidade? Prometemos a eles que seus filhos vão ter melhores chances? (se fossem bezerros com o mal da vaca louca, a gente poderia mandar sacrificar toda uma geração, não é?). Alguém aqui, estando no lugar dessas pessoas, se convenceria com esses argumentos? Quem vai para o matadouro?

Saindo das ironias (reflexos do texto do Carol), nenhuma política de cotas ou bônus é perfeita. Erros existem e vão existir. Mas, se nada fosse feito, um erro histórico continuaria INABALADO (pelo menos para essa geração, que teria de se contentar com a esperança de que seus filhos cheguem lá. Um “cheguem lá” esperado há séculos). Cotas e bônus estão sendo implantados nas universidades brasileiras. Ótimo, agora é só continuar fazendo o que sabemos: vamos criticar, vamos melhorar o sistema e buscar a perfeição. Vamos procurar a felicidade porque ninguém merece sofrer (ou merece?)

Exemplo 3: assistencialismo/distribuição de renda. A favor ou contra?

“Tem gente que gasta todo o bolsa família com cachaça”. Não conheço, mas deve ter sim. Tem umas que tem filho só pra receber o dinheiro (ainda bem que minha esposa não é dessas). E pra piorar, tem criança ficando obesa com esses 20 reais (estadão.com.br/obesidade-atinge-crianças-do-bolsa-familia) Um absurdo!

Por falar nisso (uma pequena digressão), discutamos uma questão crucial: atrelar o valor da bolsa à compra do essencial (comida, por exemplo) ou respeitar a liberdade das pessoas escolherem o que comprar e decidirem sua própria vida? (pergunta difícil, ein?)

Enquanto o Brasil não vira Dinamarca e nem todos têm formação para “buscar seu lugar no mercado” (e nem tem mercado para todos), poderíamos tentar distribuir um pouco de renda (tudo bem que há crianças que ficam obesas com 20 reais, mas essa mixaria não dá nem pro ácido do meu carnaval – outra ironia, desculpem). Para tomar uma medida, temos de discuti-la, planejá-la e observar outras experiências nessa direção. Mas num certo momento (mesmo que for arbitrário) temos que começar a agir, não é?

Conclusões

Vejo sempre uma crítica pesadíssima sobre a implantação de certas políticas sociais (de inclusão, principalmente) baseada no argumento de que elas contêm falhas e gerarão novas distorções, mas, muitas vezes, se esquece que essas políticas poderão pelo menos paliar ou ajudar a combater falhas muito maiores que já existem desde os tempos da colônia. Não será a política vigente ainda mais falha?

A História não aceita “Ctrl + Z”, também não aceita a abertura de um novo arquivo. É como se houvéssemos gerado uma linha no Corel que não ficou reta e tivéssemos de endireitá-la mexendo ponto por ponto. Embora um nível adequado de zoom possa ajudar, a mão escorrega.

Por que para tentar ajudar os setores desfavorecidos da sociedade temos de ser tão preciosistas? (ou mesquinhos?). Eu realmente não ligo de ser um pouco mais cobrado numa prova, uma vez que tive chances de ter uma escola melhor (estou sendo exageradamente solidário ou sou apenas razoável? – eu lhes digo que nem cristão eu sou). O que é justo então? (ô discussão difícil, vamos por esse povo na Universidade ao invés de nos masturbarmos intelectualmente?)

Prestem atenção: a política social (de inclusão, distribuição de renda, o que seja) perfeita não vai chegar. Em primeiro lugar, porque ela não pode ser algo isolado; ela tem de ser parte de um conjunto de ações projetadas para (um) certo(s) contexto(s) que muda(m) o tempo todo). Em segundo, porque ela dificilmente vai agradar a todos os setores – que, lamentavelmente, não abrem mão dos seus interesses.

O que nos resta fazer é discernir até que ponto vai a procura por uma medida realmente boa ou uma defesa de interesses disfarçada – travestida de preciosismo.

Carlos Jáuregui (jornalista e ex-aluno do Curso de Comunicação)

3 comentários:

Calebe disse...

Acho o problema da linha no Corel fácil de resolver. Os outros, nem tanto. Enfim, ressalto outro ponto de vista. Para quem já formou, as cotas são ótimas: menos gente qualificada formando a cada ano. Não dá pre negar que a entrada de cotistas diminui a qualidade do ensino, já que de fato a média intelectual dos alunos é menor (dentro dessa inteligência burra que é ser aluno). Talvez isso vá se equilibrando com o tempo. Mas, como já dizia um sábio personagem, "essa pica não é mais minha". Abraço e parabéns pelo texto *contundente*.

Lu disse...

Como se Vestibular medisse inteligência de alguém...
e mesmo se medisse, os chamados "burros" não teriam condições de passar nem na primeira etapa. Se passam, a qualidade do ensino pode sim se manter elevada.

Unknown disse...

A UDR não pode de forma alguma ser comparada ao MST.

O MST não tem CNPJ de propósito, para não ser processado. Recebe dinheiro do governo de forma ilegal e comete várias barbaridades, inclusive matar.

A UDR é uma instituição que tem a decência, de, no mínimo, mostrar a cara.

Por mais que eu deteste o meta-capitalismo brasileiro, esse capitalismo de fachada no qual empresários podem resolver problemas com leis, não há dúvida de quem tem a superioridade moral da coisa.

Discorda? Processe a UDR. Já o MST...